Ultimamente tenho sido abordada na rua - vantagens de viver num meio pequeno - para escrever sobre a nossa insularidade, contaram-me algumas histórias com graça (muitas delas estão aqui), são tantas as coisas para escrever e aprofundar, mas em jeito de "resumo" decidi fazer uma espécie de "lista" no artigo desta semana: para quem é de fora pode parecer estranho, mas para quem é da ilha é normal. (uma coisa é certa: pelo estranho ser tão normal, faz de mim mais terceirense.)
É normal e é na
Terceira
Margarida B. Martins Machado – Crónicas da
rapariga do sótão
-Meter uma corda a um touro e
correr à frente dele.
-A colega no trabalho dizer que
não dormiu na última noite porque as vacas do vizinho entraram pela casa a
dentro e comeram a horta do marido.
-Estar no avião que demora mais
de 30 minutos para aterrar porque há um animal à solta a correr na pista do
aeroporto (quais drones…).
-Ir correr para o Monte Brasil,
sair de lá com uma Massa Sovada - porque havia festa na ermida do Santo António
- e, mesmo com o pão nas mãos, continuar a correr.
-Contar o tempo com a seguinte
expressão: “antes ou depois do sismo?”.
-Ficar ofendido quando no 5º touro não entraram lá em casa.
-Encher a rua principal e mais
movimentada da cidade com cadeiras, como se não houvesse mais vida para além do
desfile e das marchas de São João.
-Chegar atrasada ao trabalho
porque é obrigatório cumprimentar todas as pessoas conhecidas que estão na rua.
-Pensar que o tempo da reforma
será gasto num banco no Alto das Covas.
-Os pastores são homens rijos,
não tomam conta de ovelhas, agarram é a corda ao touro.
-Beber café todos os dias no
mesmo café e, passados uns meses, ser convidada para a função da coroação do
empregado do balcão.
-Achar que só se vai ali num
instantinho beber um copo depois do trabalho e chegar a casa depois da meia
noite.
-Estar alerta vermelho com a
possibilidade de passar um furacão e, ainda assim, decidir fazer um churrasco
porque o tempo está “abafado”.
-Reencontrar a amiga, que há mais
de 10 anos migrou para o continente, falar com ela como se a tivesse visto
ontem.
-Chegar ao carro e ter o
parquímetro pago por um desconhecido, metido no para-brisas.
-Dar nomes às vacas e falar-lhes
como fossem cães: “senta Mimosa!”.
-Convencer-se que roubar a
americanos não é pecado.
-Quando ouve um barulho de uma
ambulância ligar a todos os filhos/netos para perceber se não foi com eles.
-Falar mal de alguém ao parente
desse alguém.
-Atravessar fora da passadeira na
rua da Sé, mesmo com as centenas de passadeiras que a rua da Sé tem.
-Achar que é primo de toda a
gente.
-Tratar os políticos importantes
com as alcunhas do tempo do liceu.
-Ir dar um recado à vizinha e
sair de lá passadas três horas com as novidades de toda a rua.
-Dar mais importância às rivalidades
das ganadarias do que às dos partidos políticos ou do futebol.
-Jogar golfe, porque aqui é um
desporto de massas e não de elites.
-Fechar uma rua para um
casamento.
-Não haver nenhum dia de verão
sem festas.
-Ter que tirar férias depois das
festas.
-Cumprimentar e falar com os
turistas, tentar explicar as nossas tradições, mesmo quando não se sabe falar
inglês (atenção falar mais alto não significa que te compreendem melhor).
-Passar os dias de carnaval
sentados numa sociedade, apanhar constipações, mas nunca se levantar da
cadeira, nem mesmo quando se está aflito para ir à casa de banho.
-Mandar foguetes para o ar em
sinal de aviso que há touro na rua.
Por vezes dou por mim a pensar na
nossa incomum normalidade e é por isso que sou apaixonada pela Terceira.
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coracao.blogspot.pt/
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