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sábado, 29 de julho de 2017

A açorianidade saboreia-se | Por Patrícia Foodwithameaning

Encontrei-me com esta receita, duvido que tenha sido por acaso:

A açorianidade saboreia-se

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É raro o domingo que eu não dê um saltinho à Feira do Gado na Vinha Brava, da qual já falei aqui anteriormente. De facto, esta rotina dominical tem contribuído para que abasteçamos a casa semanalmente de legumes e frutas frescas, regionais e biológicas. Naquele espaço reside a alma e o trabalho árduo de muita gente, a génese da ilha e uma fração da açorianidade, que eu faço questão de enaltecer sempre que posso.
Seguindo esta linha de pensamento, de que os produtos locais e estivais são os mais saudáveis e saborosos, decidi aceitar o convite da empresa EMATER para dinamizar, nos quatro supermercados Guarita e no mês de junho, oito showcookings totalmente dedicados aos produtos regionais. Nesta receita está a prova de que nem tudo o que é tradicional tem de ser calórico e açucarado. Esta é uma receita vegetariana saudável e repleta de sabor.


Legumes assados com azeitonas do Porto Martins, Tomilho e Rosmaninho
Ingredientes
  • cenoura
  • alho-francês
  • curgetes pequenas
  • cebola roxa
  • pimento amarelo
  • pimento encarnado
  • azeitonas em salmoura do Porto Martins
  • Tomilho e rosmaninho fresco
  • sal
  • moinho de pimentas
  • azeite
Preparação
Lavar e picar os legumes a gosto, temperar com sal, moinho de pimentas, azeite, ramos de tomilho e de rosmaninho, juntar as azeitonas e levar ao forno a assar.

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Açorianidade

A "Açorianidade" é mais do que um conceito social, mas também é mais do que o sentimento, somente Nemésio para conseguir descrever aquilo que é básicos em nós açorianos:

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«Não sei se chego a tempo com a minha colaboração para a Insula no V centenário do descobrimento dos Açores. É uma colaboração estritamente sentimental, uma espécie de minuto de recolhimento em meia dúzia de linhas.

Entendo que uma comemoração deste vulto deve ser, mesmo quanto a palavras, rigorosamente monumental, feita de estudos e reflexões que ajudem a consciência açoriana a tomar conta de si mesma e contribuam para que os Açores, como corpo autónomo de terras portuguesas (um autêntico viveiro de lusitanidade quatrocen­tista), entrem numa fase de actividade renovada, de re­construção, de esforço humano e cívico. E neste mo­mento, é-me impossível dar a mínima contribuição nesse sentido.

Quisera poder enfeixar nesta página emotiva o essencial da minha consciência de ilhéu. Em primeiro lugar o apego à terra, este amor elementar que não conhece razões, mas impulsos; – e logo o sentimento de uma he­rança étnica que se relaciona intimamente com a grandeza do mar.

Um espírito nada tradicionalista, mas humaníssimo nas suas contradições com um temperamento e uma forma literária cépticos, – o basco espanhol Baroja, – escre­veu um livro chamado Juventud, Egolatria: «O ter nascido junto do mar agrada-me, parece-me como um augúrio de liberdade e de câmbio». Escreveu a verdade. E muito mais quando se nasce mais do que junto ao mar, no próprio seio e infinitude do mar, como as medusas e os peixes. Era este orgulho feito de singularidade e solidão que levava Antero a chamar aos portugueses da metrópole os seus «quási patrícios».

Uma espécie de embriaguez do isolamento impregna a alma e os actos de todo o ilhéu, estrutura-lhe o espírito e procura uma fórmula quase religiosa de convívio com quem não teve a fortuna de nascer, como o logos, na água. Daqui partiria o fio das reflexões que me agradaria desenvolver.

Meio milénio de existência sobre tufos vulcânicos, por baixo de nuvens que são asas e de bicharocos que são nuvens, é já uma carga respeitável de tempo, – e o tempo é espírito em fiéri. Mais outro tanto, e apenas trocaremos metade da memorialidade de Vergílio.

Somos portanto, gente nova. Mas a vida açoriana não data espiritualmente da colonização das ilhas: antes se projecta num passado telúrico que os geólogos redu­zirão a tempo, se quiserem... Como homens, estamos sol­dados historicamente ao povo de onde viemos e enraizados pelo habitat a uns montes de lava que soltam da própria entranha uma substância que nos penetra. A geografia, para nós, vale outro tanto como a história, e não é debalde que as nossas recordações escritas inserem uns cinquenta por cento de relatos de sismos e enchentes. Como as se­reias temos uma dupla natureza: somos de carne e pedra. Os nossos ossos mergulham no mar.

Mas este simbolismo está muito longe de aludir com clareza aos segredos do ser açoriano, e mais parece um entretenimento literário do que um sério propósito de pôr o problema da nossa alma. Um dia, se me puder fechar nas minhas quatro paredes da Terceira, sem obrigações para com o mundo e com a vida civil já cumprida, tentarei um ensaio sobre a minha açorianidade subjacente que o desterro afina e exacerba. Antes desse dia de libertação íntima mal poderei fazer-me entender dos outros. Um aceno de ternura, um vago protesto de solidariedade insu­lar a distância é o muito que estas linhas podem significar."»


Vitorino Nemésio, 
Coimbra (Cruz de Celas), 19 de Julho de 1932

quarta-feira, 12 de julho de 2017

HEart na comunicação social | Diário Insular #19

Ultimamente tenho sido abordada na rua - vantagens de viver num meio pequeno - para escrever sobre a nossa insularidade, contaram-me algumas histórias com graça (muitas delas estão aqui), são tantas as coisas para escrever e aprofundar, mas em jeito de "resumo" decidi fazer uma espécie de "lista" no artigo desta semana:  para quem é de fora pode parecer estranho, mas para quem é da ilha é normal. (uma coisa é certa: pelo estranho ser tão normal, faz de mim mais terceirense.)







É normal e é na Terceira
Margarida B. Martins Machado – Crónicas da rapariga do sótão


-Meter uma corda a um touro e correr à frente dele.
-A colega no trabalho dizer que não dormiu na última noite porque as vacas do vizinho entraram pela casa a dentro e comeram a horta do marido.
-Estar no avião que demora mais de 30 minutos para aterrar porque há um animal à solta a correr na pista do aeroporto (quais drones…).
-Ir correr para o Monte Brasil, sair de lá com uma Massa Sovada - porque havia festa na ermida do Santo António - e, mesmo com o pão nas mãos, continuar a correr.
-Contar o tempo com a seguinte expressão: “antes ou depois do sismo?”.
-Ficar ofendido quando no 5º touro não entraram lá em casa.
-Encher a rua principal e mais movimentada da cidade com cadeiras, como se não houvesse mais vida para além do desfile e das marchas de São João.
-Chegar atrasada ao trabalho porque é obrigatório cumprimentar todas as pessoas conhecidas que estão na rua.
-Pensar que o tempo da reforma será gasto num banco no Alto das Covas.
-Os pastores são homens rijos, não tomam conta de ovelhas, agarram é a corda ao touro.
-Beber café todos os dias no mesmo café e, passados uns meses, ser convidada para a função da coroação do empregado do balcão.
-Achar que só se vai ali num instantinho beber um copo depois do trabalho e chegar a casa depois da meia noite.
-Estar alerta vermelho com a possibilidade de passar um furacão e, ainda assim, decidir fazer um churrasco porque o tempo está “abafado”.
-Reencontrar a amiga, que há mais de 10 anos migrou para o continente, falar com ela como se a tivesse visto ontem.
-Chegar ao carro e ter o parquímetro pago por um desconhecido, metido no para-brisas.
-Dar nomes às vacas e falar-lhes como fossem cães: “senta Mimosa!”.
-Convencer-se que roubar a americanos não é pecado.
-Quando ouve um barulho de uma ambulância ligar a todos os filhos/netos para perceber se não foi com eles.
-Falar mal de alguém ao parente desse alguém.
-Atravessar fora da passadeira na rua da Sé, mesmo com as centenas de passadeiras que a rua da Sé tem.
-Achar que é primo de toda a gente.
-Tratar os políticos importantes com as alcunhas do tempo do liceu.
-Ir dar um recado à vizinha e sair de lá passadas três horas com as novidades de toda a rua.
-Dar mais importância às rivalidades das ganadarias do que às dos partidos políticos ou do futebol.
-Jogar golfe, porque aqui é um desporto de massas e não de elites.
-Fechar uma rua para um casamento.
-Não haver nenhum dia de verão sem festas.
-Ter que tirar férias depois das festas.
-Cumprimentar e falar com os turistas, tentar explicar as nossas tradições, mesmo quando não se sabe falar inglês (atenção falar mais alto não significa que te compreendem melhor).
-Passar os dias de carnaval sentados numa sociedade, apanhar constipações, mas nunca se levantar da cadeira, nem mesmo quando se está aflito para ir à casa de banho.
-Mandar foguetes para o ar em sinal de aviso que há touro na rua.

Por vezes dou por mim a pensar na nossa incomum normalidade e é por isso que sou apaixonada pela Terceira.
http://no-teu- coracao.blogspot.pt/

margaridabenedita@gmail.com


terça-feira, 27 de junho de 2017

HEart na comunicação social | Diário Insular #18


Margarida B. Martins Machado – Crónicas da rapariga do sótão

Não muito longe na História, em 2015, a nossa mui nobre, leal e sempre constante cidade foi invadida por famosas placas toponímicas (famosas, não pelas melhores razões, mas pela polémica linguística).

Este artigo não pretende renascer a controvérsia, nem muito menos comentar o facto de o senhor presidente. Álamo de Meneses, na altura, ter respondido à Agência Lusa que um dos problemas era estarmos habituados ao inglês americano ou que “o gosto de cada um não pode ser aferido por estas coisas". Contudo “Straight Street is not a matter of taste!” Não querendo encontrar culpados. Foi um erro e por muitas coisas boas que a Câmara de Angra faça, que o faz, também está passível de errar pois, afinal de contas, “all men make mistakes!”

Contudo, esta semana, estava a descer a rua da Sé, que sem dúvida alguma está lindíssima, (arrisco a dizer que Angra é a cidade mais bonita do mundo!), vejo em cada poste de iluminação uma bandeira a anunciar o nosso orgulho: somos a primeira cidade portuguesa a ser Património Mundial! Dei por mim a ler a tradução das dezenas (posso arriscar centenas?) de bandeiras a anunciar o nosso Wolrd Heritage – sim wolrd e não world! A pergunta que mais me interpela é a seguinte: como foi possível imprimirem, em série, esta expressão, colocarem-na num poste e ninguém ter reparado no erro?

Eu sei que errar é humano – aqui entre nós, também nunca fui boa aluna a inglês - “But you have to make an effort” - por isso se algum dia me pedirem para traduzir alguma coisa (por favor nunca o peçam!) terei que reconhecer as minhas limitações e de imediato recusar tal trabalho.

Ainda me lembro que, uma semana depois da comunicação social divulgar o caso das placas mal traduzidas na rua desta cidade, a British School apresentar a melhor aluna, não só dos Açores, mas do mundo inteiro: a terceirense Mariana Coelho. Foi também no início do mês de Agosto de 2015, que este mesmo jornal, noticiou o facto de os alunos açorianos terem sido os que mais se destacaram na língua inglesa nos exames internacionais. Nós também temos a Teresa Silva Ribeiro, para quem não sabe, uma famosa angrense – nascida e vivida – mas figura nacional na área da tradução (é graças à Teresa que há legendas nos épicos: “O Senhor dos Anéis”, “Braveheart”, “Os Miseráveis”…entre muitos outros e, claro, “Guerra e Paz” da BBC). Como é possível esta incongruência? Então nós temos gente muito, mas muito boa a inglês e apresentamos esta disgrace? Why?

Sim, nos terceirenses possuímos o potencial para “speak english, as it should be”, mas mais uma vez estão desaproveitados. Não só nas instituições públicas, mas de uma maneira geral, nas empresas, organizações, escolas…existe uma dificuldade em investir no que é bom e no que é nosso. Fomos nós que criámos a máxima: “It is good, because it is american”. Quantas vezes foi preciso ir para fora para perceber que afinal aquele açoriano tem jeito com os cavalos, percebe de música, cozinha e escreve muito bem? Não investir no potencial dos nossos jovens tem sido um preconceito perigosíssimo no desenvolvimento regional. Por um lado, incentivamos a emigração de mão de obra qualificadíssima, em contrapartida baixamos o nível de exigência dos que ficam e, não obstante, enchemos a cidade de “bad writings”.

Esta disposição conservadora traduz-se em vícios e trabalhos mal feitos e, isso sim é o “top of the holes”. É urgente promover quem merece ser promovido, quem é realmente bom. Por fim, gosto muito, mesmo muito da minha cidade, ao ponto de não aceitar que nenhum turista britânico se ria dela. “It is not fair”!
http://no-teu- coracao.blogspot.pt/
margaridabenedita@gmail.com




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(Diário Insular | 27 de Junho de 2017)

quinta-feira, 22 de junho de 2017

Sanjoaninas 2017

As sanjoaninas são (as minhas) festas especiais. Enquanto não escrevo o meu aqui fica o artigo do meu companheiro das touradas, Miguel de Sousa Azevedo, do famoso Blogue Porto das Pipas:





Dias de Festa

Angra do Heroísmo fervilha por estes dias. Ano após ano é assim, e até o tempo tem ajudado aos contrastes, com manhãs sombrias e tardes de verão puro, daquelas em que rogamos pragas ao facto de estarmos a trabalhar...

O São João é já bem mais que uma espécie de padroeiro da nossa cidade património mundial - a única nos Açores e a primeira de Portugal, só para relembrar alguns... -, é uma instituição. Se os folguedos demonstram bem o espírito do nosso povo, nunca é demais frisar que as Sanjoaninas marcam o calendário a vários níveis: Político, económico e social. E de forma cada vez mais vincada.
Na Política, e especialmente em ano de Autárquicas como o presente, porque são o período latente para limpar armas e começar a esgrimir argumentos. Isto para os que se lançam na busca da eleição. Para o poder instalado, há que lançar também...mas alguns concursos - quase todos - e autorizações, e programas, de forma a parecer que quase tudo foi feito a tempo e horas. Também em tempo de festas, o povo leva passes e escorrega...

Na Economia, porque é inegável o impacto que as festas têm. Vem gente de fora, vem gente de perto, e sai de casa gente aqui do lado, que no restante ano nem sequer costumamos ver. As tascas e tasquinhas surgem em cada canto, os hotéis enchem, a cerveja corre pela cidade voraz como um tsunami.

Na vertente social nem é preciso explicar. Há uma disposição diferente nas pessoas durante estes dez dias - que este ano até são onze... -. É fácil sorrir, é fácil esquecer os impostos e as agruras da vida terrena. É fácil despejar a carteira e chegar a casa sem sentir remorsos. Até é fácil aceitar que uns espertalhões tenham acorrentado cadeiras no passeio para verem as festas. Tudo se facilita em tempos de São João, na cidade património mundial dos Açores. São tempos que se escondem das crises, arreganhando os dentes numa descarada satisfação.

Valha-nos este santo. Que ele nunca nos falte. Porque é tão bom conviver com ele.
Boas festas, Angra. Afinal e sempre a cidade dos nossos encantos.



sexta-feira, 19 de maio de 2017

HEart na comunicação social | Diário Insular #17

Na Terceira abrimos a época das touradas, neste sentido dediquei o meu ultimo artigo no DI acerca da "tolerância dos intolerantes"!

O texto é um pouco longo (corajosos os que leram!) mas mais do que touros fala sobre a amizade, sobre as pessoas incríveis que tenho na minha vida, que me ajudam a ser uma pessoa mais apaixonada pela nossa cultura, pela nossa ilha!


(Diário Insular | 19 de Maio de 2017)



(para ler melhor)
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Começou a época das touradas e eu lembrei-me de reactualizar um artigo que escrevi em tempos no meu blog, sobre a (antiga) polemica da liga nacional contra o cancro e as touradas. Para mim o tema não está assim tão desatualizado, pois é um artigo que fala de touros, cultura e amigos… tema simples e familiar para qualquer terceirense, mas pelos vistos não é totalmente compreensível para os “tolerantes”.
“Ai tal tourada” foi o artigo que no meu blog teve mais visualizações e mais comentários negativos, acreditem que já escrevi muitas coisas politicamente incorretas, mas nunca pensei que este tema tivesse tanto impacto. Depois da sua publicação recebi ameaças, chamaram-me de “besta” (entre outros nomes) e ainda me rogaram pragas, por isso achei que era uma boa altura de transcrever, agora no “Diário Insular”, a minha opinião sobre as touradas e sobre as associações que tem coragem (ou não) de receber ajudas dos toureiros e, sobretudo, a minha opinião sobre a amizade.
Apesar das intimações aqui fica:
“Ai tal Tourada”
Margarida B. Martins Machado – Crónicas da rapariga do sótão

Nunca gostei de touradas. Nunca apreciei tal espetáculo e confesso que, nos meus tempos de jovem adolescente, era uma ferranha anti-taurina. Até que me apercebi de uma comum e tremenda incoerência destes grupos de jovens (como eu): um enorme amor aos animais e um normal desprezo ao amor humano. Isto, com consequências muito práticas e correntes: os casais modernos perceberam que é muito melhor ter um cãozinho do que um bebé, que o zigoto de elefante é vida e está protegido por leis, mas um embrião humano é somente um conjunto de células…
Apercebi-me que havia uma mudança de paradigma, e eu não queria cooperar nessa “nova ordem” em que os valores estão invertidos. Assim sendo, passei de anti-taurina para pró-humana (e acreditem que é uma tarefa mais árdua).
Confesso que, nesse processo de desconversão tive algumas influências, sobretudo a grande influência da amizade. Nunca na minha família se apreciou touros, mas sempre se apreciou a compreensão e a diferença. Por isso, desde criança que tenho amigas que pensam e vivem de maneira diferente da minha, e tenho muitas amigas aficionadas ou não seria da Terceira.
Eu não percebo nada de touros, só sei que sou Rego Botelho (RB). Sei porque tenho verdadeiras amigas RB, que foram companheiras nas alegrias e que nunca falharam nas tristezas da minha vida e por elas eu sou RB.
Durante um dos muitos passeios que dei à caldeira RB, vi que aquela gente sabe verdadeiramente cuidar dos touros. Eles até chamam o animal pelo nome, percebem quando estão doentes, dão de comer, gostam mesmo do bicho. Compreendi que, para esses toiros, é preservado o interior da ilha – a natureza torna-se intocável, porque esse território pertence ao animal.
O Senhor José Faveira cuida daquelas bestas como nunca vi ninguém cuidar! Disse ao José Baldaya, patrão e amigo, que aquele touro precisava de uma vista de olhos e ele levantou-se da mesa, deixou o comer e até o copo de cerveja, para lhe meter a vista em cima. Sim, os aficionados cuidam dos animais. Nesse dia, cheguei a casa e disse à minha mãe que me ia assumir uma verdadeira RB e a minha mãe respondeu-me que era José Albino (JAF). A minha mãe também não percebe nada de touros – acho que na sua vida, tal como eu, nunca foi a uma tourada de praça – mas percebe muito de amizades, por isso é JAF porque é amiga da Fátima Albino. Porque admira a sua forma de trabalhar e porque sabe tão bem que a Fátima tem um coração do tamanho do mundo, com uma enorme capacidade de ajudar o próximo. Por isso, ela respeitava a minha decisão: gosta das minhas amigas, mas tem um compromisso com a casa JAF.
E foi esse grupo de boas pessoas que decidiu fazer uma legítima angariação de fundos para ajudar uma grande causa: a luta contra o cancro. Mas a Liga Nacional não quis aceitar esse dinheiro porque é fruto de uma tourada. Só esta atitude daria muito conversa, pois não deixa de ser uma atitude desproporcionada, para não dizer hipócrita. Contudo, o que me deixou perplexa, foi a forma como o caso foi mediatizado.
A Liga Nacional Contra o Cancro, numa forma inconveniente, pois aquele não é o meio, anunciou com um comentário no Facebook, que é anti-touradas (como se esta instituição pudesse falar em nome de todos seus sócios nesta matéria, e como se as touradas fossem tipo o genocídio do Ruanda). E não fica bem a uma instituição desautorizar os seus diretores em público, muito menos no Facebook. Há outras formas mais convenientes de o fazer, principalmente quando se tratam de homens e mulheres com valores, que deram muito à causa e que os terceirenses conhecem e admiram os seus trabalhos, sabendo do seu empenho contra esta maldita doença, que tem sido um flagelo nos Açores.
Mas as consequências que este anúncio no Facebook gerou, foram graves. Quem passou pela página do Facebook da Liga Nacional Contra o Cancro não pôde ficar indiferente aos comentários que surgiram nessa notificação - eu sei que os comentários do FB são um antro vazio de conteúdos, são simplesmente palavras de ofensa e cheias de sujidade, que valem pouquíssimo. Mas, quando repetem religiosamente que “preferem morrer do que aceitar ajuda de um toureiro”, como se pode ler, ou é porque a sociedade está doente (não de cancro mas do juízo), ou porque vivemos completamente adversos à nossa dignidade, aos direitos do homem. É dizer àqueles heróis, que na nossa história lutaram pela nossa liberdade, pelo fim da escravatura, tempos em que o homem era comparado com os animais que as suas causas foram em vão. O que eu li não foi a defesa dos animais, foi um ataque ao homem, um ataque à grandeza da vida humana.
Não pouparam ofensas aos que apreciam as touradas, insultaram aqueles que são meus amigos e que fizeram e fazem muito bem na sociedade. Não só foram ofendidos, como as suas famílias foram atacadas - até reduziram o povo da Terceira a um grupo de “bestas” medievais. Afinal os animais somos nós os terceirenses.
Amar os animais é fácil, isso é para meninos. Difícil é tolerar as pessoas e amar o homem.
Não gosto da atitude destes cibernautas, que para defender os seus ideais, utilizam baixos argumentos. São os hooligans da ideologia, hipócritas nos sentimentos: adquirem a dor dos animais que comem ao almoço e muitas vezes fecham os olhos às imagens que nos chegam da Síria ou da Nigéria.
Fico com pena que a Liga Portuguesa Contra o Cancro, que é uma instituição que eu tanto admiro, para a qual sempre contribuí, tenha criado esta situação e tenha considerado imoral o contributo de muito boa gente.
Acima de tudo, temos de ser pró-humanos, temos que lutar contra esta terrível doença que tanto ataca a sociedade açoriana. Por isso, em nome dos terceirenses, eu peço desculpa a todos os doentes oncológicos, que necessitam de auxílio, e que ficaram sem ajudas.
Tenho a ousadia de dizer que conheço pouca gente que gosta de animais como eu gosto, mas sei que a diferença entre o homem e um animal irracional é enorme, mesmo que a minha cadela Xixinha seja bem mais simpática do que muita gente que anda por aí.
Há muitas outras instituições que me fazem ter fé na humanidade. Como me disse a Presidente da ACM-Terceira, Filomena Santos –  uma mulher que lida com situações mais difíceis que muitas touradas e com as pessoas mais incríveis que eu conheço, e nos dá uma enorme esperança – “Eu sou amiga dos animais e, ainda mais amiga das pessoas.”
http://no-teu- coracao.blogspot.pt/
margaridabenedita@gmail.com

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Ai tal tourada



Nunca gostei de touradas. Nunca apreciei tal espetáculo e confesso que, nos meus tempos de jovem adolescente, era uma ferranha anti-taurina. Até que me apercebi de uma comum e tremenda incoerência destes grupos de jovens (como eu): um enorme amor aos animais e um normal desprezo ao amor humano. Isto, com consequências muito práticas e correntes: os casais modernos perceberam que é muito melhor ter um cãozinho do que um bebé, que o zigoto de elefante é vida e está protegido por leis, mas um embrião humano é somente um conjunto de células…
Apercebi-me que havia uma mudança de paradigma, e eu não queria cooperar nessa “nova ordem” em que os valores estão invertidos. Assim sendo, passei de anti-taurina para pró-humana (e acreditem que é uma tarefa mais árdua).
Confesso que, nesse processo de desconversão tive algumas influências, sobretudo a grande influência da amizade. Nunca na minha família se apreciou touros, mas sempre se apreciou a compreensão e a diferença. Por isso, desde criança que tenho amigas que pensam e vivem de maneira diferente da minha, e tenho muitas amigas aficionadas ou não seria da Terceira.
Eu não percebo nada de touros, só sei que sou Rego Botelho (RB). Sei porque tenho verdadeiras amigas RB, que foram companheiras nas alegrias e que nunca falharam nas tristezas da minha vida e por elas eu sou RB.
Durante um dos muitos passeios que dei à caldeira RB, vi que aquela gente sabe verdadeiramente cuidar dos touros. Eles até chamam o animal pelo nome, percebem quando estão doentes, dão de comer, gostam mesmo do bicho. Compreendi que, para esses toiros, é preservado o interior da ilha – a natureza torna-se intocável, porque esse território pertence ao animal.
O Senhor José Faveira cuida daquelas bestas como nunca vi ninguém cuidar! Disse ao José Baldaya, patrão e amigo, que aquele touro precisava de uma vista de olhos e ele levantou-se da mesa, deixou o comer e até o copo de cerveja, para lhe meter a vista em cima. Sim, os aficionados cuidam dos animais. Nesse dia, cheguei a casa e disse à minha mãe que me ia assumir uma verdadeira RB e a minha mãe respondeu-me que era José Albino (JAF). A minha mãe também não percebe nada de touros – acho que na sua vida, tal como eu, nunca foi a uma tourada de praça – mas percebe muito de amizades, por isso é JAF porque é amiga da Fátima Albino. Porque admira a sua forma de trabalhar e porque sabe tão bem que a Fátima tem um coração do tamanho do mundo, com uma enorme capacidade de ajudar o próximo. Por isso, ela respeitava a minha decisão: gosta das minhas amigas, mas tem um compromisso com a casa JAF.
 

 
E foi esse grupo de boas pessoas que decidiu fazer uma legítima angariação de fundos para ajudar uma grande causa: a luta contra o cancro. Mas a Liga Nacional não quis aceitar esse dinheiro porque é fruto de uma tourada. Só esta atitude daria muito conversa, pois não deixa de ser uma atitude desproporcionada, para não dizer hipócrita. Contudo, o que me deixou perplexa, foi a forma como o caso foi mediatizado.
A Liga Nacional Contra o Cancro, numa forma inconveniente, pois aquele não é o meio, anunciou com um comentário no Facebook, que é anti-touradas (como se esta instituição pudesse falar em nome de todos seus sócios nesta matéria, e como se as touradas fossem tipo o genocídio do Ruanda). E não fica bem a uma instituição desautorizar os seus diretores em público, muito menos no Facebook. Há outras formas mais convenientes de o fazer, principalmente quando se tratam de homens e mulheres com valores, que deram muito à causa e que os terceirenses conhecem e admiram os seus trabalhos, sabendo do seu empenho contra esta maldita doença.
Mas as consequências que este anúncio no Facebook gerou, foram graves. Quem passou pela página do Facebook da Liga Nacional Contra o Cancro não pôde ficar indiferente aos comentários que surgiram nessa notificação - eu sei que os comentários do FB são um antro vazio de conteúdos, são simplesmente palavras de ofensa e cheias de sujidade, que valem pouquíssimo. Mas, quando repetem religiosamente que “preferem morrer do que aceitar ajuda de um toureiro”, como se pode ler, ou é porque a sociedade está doente (não de cancro mas do juízo), ou porque vivemos completamente adversos à nossa dignidade, aos direitos do homem. É dizer àqueles heróis, que na nossa história lutaram pela nossa liberdade, pelo fim da escravatura, tempos em que o homem era comparado com os animais que as suas causas foram em vão. O que eu li não foi a defesa dos animais, foi um ataque ao homem, um ataque à grandeza da vida humana.
Não pouparam ofensas aos que apreciam as touradas, insultaram aqueles que são meus amigos e que fizeram e fazem muito bem na sociedade. Não só foram ofendidos, como as suas famílias foram atacadas - até reduziram o povo da Terceira a um grupo de “bestas” mediáveis. Afinal os animais somos nós os terceirenses.
Amar os animais é fácil, isso é para meninos. Difícil é tolerar as pessoas e amar o homem.
Não gosto da atitude destes cibernautas, que para defender os seus ideais, utilizam baixos argumentos. São os hooligans da ideologia, muitas vezes hipócritas nos sentimentos: adquirem a dor dos animais que comem ao almoço e muitas vezes fecham os olhos às imagens que nos chegam da Síria ou da Nigéria.
Fico com pena que a Liga Portuguesa Contra o Cancro, que é uma instituição que eu tanto admiro, para a qual sempre contribuí, tenha criado esta situação e tenha considerado imoral o contributo de muito boa gente.
Acima de tudo, temos de ser pró-humanos, temos que lutar contra esta terrível doença que tanto ataca a sociedade açoriana. Por isso, em nome dos terceirenses, eu peço desculpa a todos os doentes oncológicos, que necessitam de auxílio, e que ficaram sem ajudas.
Vou continuar a não ir às touradas de praça, e até tenho a ousadia de dizer que conheço pouca gente que gosta de animais como eu gosto, mas sei que a diferença entre o homem e um animal irracional é enorme, mesmo que a minha cadela Xixinha seja bem mais simpática do que muita gente que anda por ai.
Há muitas outras instituições que me fazem ter fé na humanidade. Como me disse a Presidente da ACM-Terceira, Filomena Santos –  uma mulher que lida com situações mais difíceis que muitas touradas e com as pessoas mais incríveis que eu conheço, e nos dá uma enorme esperança –  “Eu sou amiga dos animais e, ainda mais amiga das pessoas.”