quinta-feira, 7 de março de 2013

Sofrer por antecipação

Há um ano deu-lhe um anel como quem diz sou teu. E ela, sem hesitar, respondeu claro que sim, porque há nove anos que esperava dizer sim.

Não há dúvida de que querem ser um para o outro e é a certeza disso que os faz muito felizes e capazes de enfrentar qualquer dificuldade. São muito iguais em certas coisas, nas fundamentais, nos ideais. Mas nas outras é tudo diferente: nos passeios, nas cores, nos filmes, nas pipocas - ela é mais doce, ele é mais salgado; na maneira de agir - ele é mais do tipo preto no branco, enquanto, para ela, há toda uma incrível gama de cinzentos para contemplar.

Mas sempre tiveram um problema. Enquanto ela vive no seu jardim na estratosfera até cair nos acontecimentos, ele vive nos factos com um realismo notável reagindo a tudo por antecipação.

Então, três dias antes de ela partir, ele já deprimiu. Em vez de aproveitar plenamente todos os minutos para estar com ela, dá-lhe para a melancolia e, porque nunca perde a compostura, justifica-se com estas pérolas: a situação dos que ficam é sempre mais triste do que a dos que partem. Partir é um movimento que dissipa, e nada distrai as pessoas que ficam.

Ela exprime o seu lado mais sensato ao sugerir-lhe: pensa no “agora” sem te lembrares do “ontem”, que já passou, e sem te preocupares com o “amanhã”, que não sabes se chegará para ti e diz-lhe isto com a convicção de quem chuta para o lado o que lhe apetece sentir:
Partir!
Nunca voltarei,
Nunca voltarei porque nunca se volta.
O lugar a que se volta é sempre outro,
A gare a que se volta é outra.
Já não está a mesma gente, nem a mesma luz...

É uma arte - ensinaram-lhe desde cedo - a de chutar as coisas bonitas, mas que não têm sentido. É a arte de saber pôr rédeas no coração e de sermos donos dos nossos pensamentos, desejos e anseios. Por isso, há coisas que se chutam, não vamos nós senti-las, muito menos, dizê-las. E assim, à força de chutar, no momento da verdade:
Ainda não foste, mas já estou com saudades – disse ele.
É só uma semana, meu amor.
 
 
 
 

3 comentários:

Unknown disse...

Que bonito texto! Será que ele percebe, agora, o que ela sente quando.ele viaja pelo mundo meses sem fim? ;)
Que texto lindo!! Parabéns pelo ano de.noivado. Bjs

Kika disse...

Querida Rosarinho,
Quer-me parecer que ele não faz a mais pálida ideia ;)
muito obrigada!!! um beijinho enorme

Ana disse...

LINDO!!!!