"Ouvi os assassinos a chamarem pelo meu nome.
estavam do outro lado da parede, e separavam-nos apenas alguns milímetros de estuque e madeira. As suas vozes eram frias, duras e determinadas.
- Está aqui... sabemos que está aqui algures... encontem-na: encontrem Immaculée.
Havia muitas vozes, muitos assassinos. Conseguia visualizá-los na minha mente: os meus amigos e vizinhos - que sempre me tinham cumprimentado com amor e bondade - a moverem-se pela casa, com lanças e catanas e chamando pelo meu nome.
- Matei 399 baratas - disse um dos assassinos. - A Immaculée será o número 400. É um bom número de pessoas para matar.
Fugi para o canto da nossa minúscula casa de banho secreta e não movi um músculo. Tal como as outras cinco mulheres que se escondiam comigo, temendo pelas suas vidas, sustive a respiração de modo a que os assassinos não me ouvissem respirar.
As suas vozes eram como garras na minha carne. Senti-me como se estivesse deitada numa cama de brasas a arder, como se me tivessem ateado fogo. Uma dor envolveu o meu corpo; mil agulhas invisíveis romperam a minha pele. Nunca pensei que o medo pudesse causar uma dor física tão agonizante.
Tentei engolir, mas a minha garganta fechou-se. Não tinha saliva e a minha boca estava mais seca do que areia. Fechei os olhos e tentei fazer-me desaparecer, mas as vozes tornaram-se mais altas. Sabia que não mostrariam qualquer piedade. Na minha mente ecoou um pensamento: Se me apanham, matam-me. Se me apanham, matam-me. Se me apanham, matam-me...
Os assassinos estavam mesmo por detrás da porta e eu sabia que me encontrariam a qualquer momento. Imaginei o que sentiria quando a catana me golpeasse a pele e me cortasse os ossos. Pensei nos meus irmãos e nos meus queridos pais, perguntando-me se estariam mortos ou vivos e se em breve nos encontraríamos no paraíso.
Juntei as mãos, agarrei no rosário do meu pai e comecei a rezar silenciosamente: Por favor, meu Deus, ajudai-me. Não me deixeis morrer assim, não assim. Não deixeis estes assassinos encontrarem-me, meu Deus, estou a pedir. Por favor, fazei com que estes assassinos vão embora. Por favor, não me deixeis morrer nesta casa de banho. Por favor, meu Deus, por favor, por favor, por favor, salvai-me!Salvai-me!
Os assassinos saíram da casa e todos voltámos a respirar. Foram-se, mas voltariam muitas vezes nos três meses seguintes. Creio que Deus me poupou a vida, mas descobri nos noventa e um dias que passei a tremer de medo, com outras sete pessoas naquela exígua casa de banho, que ser poupada é muito diferente de ser salva... e essa lição mudou-me para sempre. Foi essa lição que me ensinou, no meio daquele assassínio em massa, amar os que me odiavam e perseguiam - e a perdoar os que chacinaram a minha família.
O meu nome é Immaculée Ilibagiza. Esta é a história de como descobri Deus durante um dos mais sangrentos holocaustos da história."
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