Numa altura em que Sofia Ribeiro assumiu publicamente querer "seguir o exemplo dos milhares de Mulheres, guerreiras, que conseguiram ganhar ao cancro", a pergunta torna-se inevitável: Afinal, a batalha só é ganha se se sobreviver? Ou a vida pode ser salva de outra forma?
26-11-2015 - Um médico oncologista do hospital hebraico de Montreal recorda a amizade que nasceu com Carla, uma doente, nos meses antes de sua morte. As férias com a comunidade e “o enamoramento” que a fez sentir-se mais viva que nunca
Pode um homem nascer de novo sendo velho? Estarei para sempre agradecido pela possibilidade de lembrar a minha amizade com a Carla, que me põe em condições de responder a essa pergunta. Eu sou médico oncologista no hospital hebraico de Montreal e conheci a Carla há dois anos, quando lhe foi diagnosticado um cancro da mama em estado avançado.
(...) Ela tinha criado uma espécie de carapaça, dedicando muito do seu tempo ao trabalho numa instituição de Protecção da Infância num cargo de responsabilidade e enfrentando muitos casos difíceis. Nunca tinha casado e estava acostumada a dar ordens e a ter o comando. Mas é um grande problema quando se tem um diagnóstico de cancro em estado avançado, porque isso despedaça completamente a sensação de teres o controlo das coisas e te obriga a cuidar de ti próprio em e não dos outros, fazendo-te sentir de certo modo mais vulnerável.
(...) Era evidente que ela estava a lutar contra a sensação de não ter o controlo e ia aos poucos aceitando os seus novos limites físicos. Além dos sintomas do cancro e dos efeitos secundários das terapias, discutíamos muitas vezes sobre a liberdade e a dependência, sobre aceitar o facto de termos sido amados primeiro e sobre o reconhecimento da presença de Deus em cada circunstância. As perguntas dela eram as mesmas que eu tinha e eu não podia mentir. Conversando sobre o seu trabalho na Protecção da Infância, eu falei-lhe nos dois irmãozinhos que adoptei. Perante aquelas perguntas eu só podia falar da minha experiência e dos meus amigos: os mesmos amigos que ela conheceu pela primeira vez no nosso concerto de Natal, no qual participou com a sua irmã e familiares.
Lentamente o rosto dela começou a mudar, assim como a sua atitude. Livre. Com a liberdade que vem duma gratidão. O ponto de não retorno para ela foram as férias com os adultos e as famílias de CL, em que ela participou com a sua bengala e uma grande curiosidade. É difícil descrever o que lhe aconteceu lá a não ser com o termo “enamoramento”. Na volta das férias ela começou a ler e a informar-se sobre o Movimento e a perguntar à Paula sobre a nossa história e a nossa amizade. A par da beleza que ela tinha visto, aquilo que tinha conquistado a Carla era o facto de que a sua liberdade era continuamente provocada e jamais forçada. Quando a irmã dela lhe começou a fazer perguntas, mostrando uma certa curiosidade pelo Movimento, a Carla disse: “Eu nunca vi nada parecido. Nas férias eu chorava todos os dias no meu quarto, de tal maneira me sentia arrebatada por tudo aquilo... Não tenho certeza de que estejas realmente pronta para isso!”... Não era exatamente o “Vinde e vede” do Evangelho, mas felizmente isso não desencorajou a irmã de Carla, que em Setembro começou a frequentar a Escola de Comunidade com ela.
(...) Poucas semanas antes de morrer, Carla teve a possibilidade de participar num casamento, acompanhada por um amigo da comunidade. À mesa, radiosa com a sua peruca, que ela na realidade odiava, tinha começado a contar a todos os seus velhos amigos – entre os quais muitos judeus – o seu encontro com o Movimento. “Este cancro salvou-me a vida. Digo realmente. Não sou ingénua, sei muito bem que vou morrer em breve, mas nunca estive tão viva. Vocês também precisam de ver o que eu vi, nunca vi nada parecido”.
(...) Ela tinha criado uma espécie de carapaça, dedicando muito do seu tempo ao trabalho numa instituição de Protecção da Infância num cargo de responsabilidade e enfrentando muitos casos difíceis. Nunca tinha casado e estava acostumada a dar ordens e a ter o comando. Mas é um grande problema quando se tem um diagnóstico de cancro em estado avançado, porque isso despedaça completamente a sensação de teres o controlo das coisas e te obriga a cuidar de ti próprio em e não dos outros, fazendo-te sentir de certo modo mais vulnerável.
(...) Era evidente que ela estava a lutar contra a sensação de não ter o controlo e ia aos poucos aceitando os seus novos limites físicos. Além dos sintomas do cancro e dos efeitos secundários das terapias, discutíamos muitas vezes sobre a liberdade e a dependência, sobre aceitar o facto de termos sido amados primeiro e sobre o reconhecimento da presença de Deus em cada circunstância. As perguntas dela eram as mesmas que eu tinha e eu não podia mentir. Conversando sobre o seu trabalho na Protecção da Infância, eu falei-lhe nos dois irmãozinhos que adoptei. Perante aquelas perguntas eu só podia falar da minha experiência e dos meus amigos: os mesmos amigos que ela conheceu pela primeira vez no nosso concerto de Natal, no qual participou com a sua irmã e familiares.
Lentamente o rosto dela começou a mudar, assim como a sua atitude. Livre. Com a liberdade que vem duma gratidão. O ponto de não retorno para ela foram as férias com os adultos e as famílias de CL, em que ela participou com a sua bengala e uma grande curiosidade. É difícil descrever o que lhe aconteceu lá a não ser com o termo “enamoramento”. Na volta das férias ela começou a ler e a informar-se sobre o Movimento e a perguntar à Paula sobre a nossa história e a nossa amizade. A par da beleza que ela tinha visto, aquilo que tinha conquistado a Carla era o facto de que a sua liberdade era continuamente provocada e jamais forçada. Quando a irmã dela lhe começou a fazer perguntas, mostrando uma certa curiosidade pelo Movimento, a Carla disse: “Eu nunca vi nada parecido. Nas férias eu chorava todos os dias no meu quarto, de tal maneira me sentia arrebatada por tudo aquilo... Não tenho certeza de que estejas realmente pronta para isso!”... Não era exatamente o “Vinde e vede” do Evangelho, mas felizmente isso não desencorajou a irmã de Carla, que em Setembro começou a frequentar a Escola de Comunidade com ela.
(...) Poucas semanas antes de morrer, Carla teve a possibilidade de participar num casamento, acompanhada por um amigo da comunidade. À mesa, radiosa com a sua peruca, que ela na realidade odiava, tinha começado a contar a todos os seus velhos amigos – entre os quais muitos judeus – o seu encontro com o Movimento. “Este cancro salvou-me a vida. Digo realmente. Não sou ingénua, sei muito bem que vou morrer em breve, mas nunca estive tão viva. Vocês também precisam de ver o que eu vi, nunca vi nada parecido”.
Podem ler este fortíssimo testemunho na íntegra aqui.
1 comentário:
Incrível!
Enviar um comentário