"Querido Pai,
Ainda não nasci, mas também eu, como a Care, te quero pedir ajuda.
Quero-te pedir ajuda para me ensinares o valor que eu tenho, e que vai muito além de qualquer palavrão que me possam chamar na escola ou na vida.
Quero que me ensines a responder à altura, sem malícia, mas com assertividade, a quem me insulte ou ofenda. E que eu saiba travar as minhas próprias lutas, interiores e exteriores.
Quero que me ajudes a falar, mesmo quando as ofensas não me forem dirigidas a mim, mas às minhas amigas ou a qualquer outra mulher, ou homem. Porque a igualdade é isso.
Quero que me ajudes a ter uma atitude digna, sempre. E que mesmo que eu falhe (e vou falhar), posso sempre recuperar a minha dignidade sem que isso me torne "incoerente", mas humilde.
Quero-te pedir ajuda para me ensinares que não preciso de estar a cair de bêbada, nunca. Que hei-de saber beber com moderação, e mesmo quando beber de mais, comportar-me adequadamente qb.
Quero que me mostres que o fundamentalismo não leva a lado nenhum. Seja na comida - a mãe sempre comeu sushi, e que bem que me sabia! -, seja nos estudos, seja com os outros.
Mas quero que me ensines a ser forte. Forte nos valores, forte nas convicções e forte na afirmação da minha identidade e dos meus desejos, nunca os resumindo apenas ao momento presente sem equacionar o futuro. Que me ensines a exigir ser respeitada, em qualquer ocasião e por qualquer pessoa, sem precisar de me moldar para agradar aos outros.
Quero que me ajudes a encontrar os critérios adequados para amar. Que queiras conhecer os meus amigos e namorados, e não lhes exijas mais do que que me ajudem no caminho rumo à felicidade. Porque esse devia ser o critério último, o único que verdadeiramente interessa.
Quero que me dês a liberdade de escolher o que vou estudar, com quem vou namorar e com quem vou casar. E que me ensines que o namoro não é mais que o discernimento aprofundado das qualidades humanas, e que até ao último segundo posso sempre mudar de ideias. Mesmo que o casamento já esteja organizado e te tenha custado uma pipa de massa. Porque me pões a mim primeiro, porque sempre puseste. É esse o meu valor para ti: infinito.
Quero que a educação que me dês não me dê desculpas para mudar a minha visão sobre mim mesma ao sabor das opiniões ou ofensas alheias, mas seja uma ajuda a um juízo verdadeiro sobre o que eu sou, o que faço bem e o que faço mal. Mas por muito mal que faça, a misericórdia espera-me sempre que eu a queira, sem que mereça ser castigada por ninguém.
Com isto tudo, espero que me ajudes a construir uma vida com uma reputação sólida, boa e da qual tu e eu nos possamos orgulhar. Não porque seja fácil ser mulher, mas porque a vida para homens e mulheres não é para ser fácil, é para ser vivida.
Por último, quero que me encorajes, repetindo-me que não está só nas mãos dos homens mudar o mundo: está também nas minhas.
Um beijinho, e até já.
AM"
Em resposta a este vídeo:
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NA: Espero sinceramente que esta venha a ser a hipotética carta da minha filha ao seu pai. Porque esta seria a minha ao meu, que - modéstia à parte - acho que fez um belíssimo trabalho. Não sou perfeita, mas não é por culpa dele. Não sou frágil, e isso é inteiramente graças a ele.
Nascer mulher, para mim, não foi um perigo. E para ti?
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