quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Não há argumentos para ter filhos

A propósito deste post, dei por mim a pensar “Porque é que eu vou ter uma filha?”
É uma pergunta meio ingrata, assim ao género prognostico no fim do jogo. Mas é relevante, porque não foi planeado-ao-milímetro.

E a resposta que me veio imediatamente foi: Vou ter uma filha porque posso engravidar. Vou ter uma filha porque engravidei. Ainda antes de eu saber que era uma menina, ela estava lá. Já sabia que uma ou um podiam ser gerados, mas só vou ser mãe porque a vida se gerou efectivamente.

Não tenho argumentos para ter filhos. Também não tenho argumentos para NÃO ter filhos. Nunca tive um desejo desmesurado de ser mãe, como também nunca tive um medo irracional de o ser, até porque sempre suspeitei que viesse a acontecer. 

Na verdade, não vou ser mãe por isso. Nem eu andava em pulgas, nem ninguém me convenceu a ficar. É simplesmente uma consequência do meu casamento, da minha (nossa) entrega, e não é racionalizável nem "convencível". Vou ter um filho porque posso engravidar, porque engravidei e porque toda a gente já o fez e eu hei-de conseguir fazê-lo, melhor ou pior, aprendendo no caminho, mas sempre a pensar mais fora de mim que em mim. 

Mas então, há argumentos para ter filhos?
Ouvem-se regularmente pais que vêem os filhos como uma posse, como um direito, como uma "coisa" que lhes pertence e que lhes serve os seus propósitos. 
Com um filho eu ficarei realizado. Com um filho é que eu vou saber o que é amar. Com um filho eu prolongo a minha linhagem. Com um filho eu tenho a quem deixar a casa. Com um filho eu tenho quem me sustente. Com um filho eu serei feliz. Com gémeos eu fico "despachado".
E são isso razões para ter um filho? Se são, deixem que vos diga sem muita cerimónia que são razões bem egoístas. Reparem na utilização de pronomes pessoais na 1ª pessoa do singular! “Eu”, “minha”, “me”. Podem ser verdade – o nosso desejo de procriação é tão básico que sim, tem de haver motivos egoístas para termos filhos, senão a taxa de natalidade seria negativa! -, mas não há nada mais redutor.

Também eu terei as minhas fases em que verei vantagens pessoais em ter filhos, mas na teoria pelo menos vejo a falácia. Se eu tenho um filho por mim, estou a tê-lo pela razão errada. Um filho é um ser independente de mim – ainda que dependa muito de mim nos primeiros anos. Mas não é, nunca é, uma extensão de mim mesma.
É uma pessoa nova, única, irrepetível, com os seus próprios gostos, desejos, ambições. Não prometo olhá-la sempre assim (quando me disser que quer ser graffiter, acham mesmo que não a vou tentar convencer a ir para gestão?), mas a realidade não estará do meu lado. A realidade é que, desde a concepção, que a minha filha é algo distinto de mim, dentro de mim. E isso é tão bonito quanto é aterrador. Se eu pensasse nisso antes, secalhar não seria mãe*. 

Por isso não, não há argumentos para ter filhos. 

Os filhos têm-se e pronto.




*Nisso e nos enjoos. Ou só nos enjoos. Isso.

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