Na Terceira abrimos a época das touradas, neste sentido dediquei o meu ultimo artigo no DI acerca da "tolerância dos intolerantes"!
O texto é um pouco longo (corajosos os que leram!) mas mais do que touros fala sobre a amizade, sobre as pessoas incríveis que tenho na minha vida, que me ajudam a ser uma pessoa mais apaixonada pela nossa cultura, pela nossa ilha!
(Diário Insular | 19 de Maio de 2017)
(para ler melhor)
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Começou a
época das touradas e eu lembrei-me de reactualizar
um artigo que escrevi em tempos no meu blog, sobre a (antiga) polemica da liga
nacional contra o cancro e as touradas. Para mim o tema não está assim tão
desatualizado, pois é um artigo que fala de touros, cultura e amigos… tema
simples e familiar para qualquer terceirense, mas pelos vistos não é totalmente
compreensível para os “tolerantes”.
“Ai tal
tourada” foi o artigo que no meu blog teve mais visualizações e mais
comentários negativos, acreditem que já escrevi muitas coisas politicamente
incorretas, mas nunca pensei que este tema tivesse tanto impacto. Depois da sua
publicação recebi ameaças, chamaram-me de “besta” (entre outros nomes) e ainda
me rogaram pragas, por isso achei que era uma boa altura de transcrever, agora
no “Diário Insular”, a minha opinião sobre as touradas e sobre as associações
que tem coragem (ou não) de receber ajudas dos toureiros e, sobretudo, a minha
opinião sobre a amizade.
Apesar das intimações
aqui fica:
“Ai
tal Tourada”
Margarida
B. Martins Machado – Crónicas da rapariga do sótão
Nunca gostei
de touradas. Nunca apreciei tal espetáculo e confesso que, nos meus tempos de
jovem adolescente, era uma ferranha anti-taurina. Até que me apercebi de uma
comum e tremenda incoerência destes grupos de jovens (como eu): um enorme amor
aos animais e um normal desprezo ao amor humano. Isto, com consequências muito
práticas e correntes: os casais modernos perceberam que é muito melhor ter um
cãozinho do que um bebé, que o zigoto de elefante é vida e está protegido por
leis, mas um embrião humano é somente um conjunto de células…
Apercebi-me
que havia uma mudança de paradigma, e eu não queria cooperar nessa “nova ordem”
em que os valores estão invertidos. Assim sendo, passei de anti-taurina para
pró-humana (e acreditem que é uma tarefa mais árdua).
Confesso que,
nesse processo de desconversão tive algumas influências, sobretudo a grande
influência da amizade. Nunca na minha família se apreciou touros, mas sempre se
apreciou a compreensão e a diferença. Por isso, desde criança que tenho amigas
que pensam e vivem de maneira diferente da minha, e tenho muitas amigas
aficionadas ou não seria da Terceira.
Eu não percebo
nada de touros, só sei que sou Rego Botelho (RB). Sei porque tenho verdadeiras
amigas RB, que foram companheiras nas alegrias e que nunca falharam nas
tristezas da minha vida e por elas eu sou RB.
Durante um dos
muitos passeios que dei à caldeira RB, vi que aquela gente sabe verdadeiramente
cuidar dos touros. Eles até chamam o animal pelo nome, percebem quando estão
doentes, dão de comer, gostam mesmo do bicho. Compreendi que, para esses
toiros, é preservado o interior da ilha – a natureza torna-se intocável, porque
esse território pertence ao animal.
O Senhor José
Faveira cuida daquelas bestas como nunca vi ninguém cuidar! Disse ao José
Baldaya, patrão e amigo, que aquele touro precisava de uma vista de olhos e ele
levantou-se da mesa, deixou o comer e até o copo de cerveja, para lhe meter a
vista em cima. Sim, os aficionados cuidam dos animais. Nesse dia, cheguei a
casa e disse à minha mãe que me ia assumir uma verdadeira RB e a minha mãe
respondeu-me que era José Albino (JAF). A minha mãe também não percebe nada de
touros – acho que na sua vida, tal como eu, nunca foi a uma tourada de praça –
mas percebe muito de amizades, por isso é JAF porque é amiga da Fátima Albino.
Porque admira a sua forma de trabalhar e porque sabe tão bem que a Fátima tem
um coração do tamanho do mundo, com uma enorme capacidade de ajudar o próximo.
Por isso, ela respeitava a minha decisão: gosta das minhas amigas, mas tem um
compromisso com a casa JAF.
E foi esse
grupo de boas pessoas que decidiu fazer uma legítima angariação de fundos para
ajudar uma grande causa: a luta contra o cancro. Mas a Liga Nacional não quis
aceitar esse dinheiro porque é fruto de uma tourada. Só esta atitude daria
muito conversa, pois não deixa de ser uma atitude desproporcionada, para não
dizer hipócrita. Contudo, o que me deixou perplexa, foi a forma como o caso foi
mediatizado.
A Liga
Nacional Contra o Cancro, numa forma inconveniente, pois aquele não é o meio,
anunciou com um comentário no Facebook, que é anti-touradas (como se esta
instituição pudesse falar em nome de todos seus sócios nesta matéria, e como se
as touradas fossem tipo o genocídio do Ruanda). E não fica bem a uma
instituição desautorizar os seus diretores em público, muito menos no Facebook.
Há outras formas mais convenientes de o fazer, principalmente quando se tratam
de homens e mulheres com valores, que deram muito à causa e que os terceirenses
conhecem e admiram os seus trabalhos, sabendo do seu empenho contra esta
maldita doença, que tem sido um flagelo nos Açores.
Mas as
consequências que este anúncio no Facebook gerou, foram graves. Quem passou
pela página do Facebook da Liga Nacional Contra o Cancro não pôde ficar
indiferente aos comentários que surgiram nessa notificação - eu sei que os
comentários do FB são um antro vazio de conteúdos, são simplesmente palavras de
ofensa e cheias de sujidade, que valem pouquíssimo. Mas, quando repetem
religiosamente que “preferem morrer do que aceitar ajuda de um toureiro”, como
se pode ler, ou é porque a sociedade está doente (não de cancro mas do juízo),
ou porque vivemos completamente adversos à nossa dignidade, aos direitos do
homem. É dizer àqueles heróis, que na nossa história lutaram pela nossa
liberdade, pelo fim da escravatura, tempos em que o homem era comparado com os
animais que as suas causas foram em vão. O que eu li não foi a defesa dos
animais, foi um ataque ao homem, um ataque à grandeza da vida humana.
Não pouparam
ofensas aos que apreciam as touradas, insultaram aqueles que são meus amigos e
que fizeram e fazem muito bem na sociedade. Não só foram ofendidos, como as
suas famílias foram atacadas - até reduziram o povo da Terceira a um grupo de
“bestas” medievais. Afinal os animais somos nós os terceirenses.
Amar os
animais é fácil, isso é para meninos. Difícil é tolerar as pessoas e amar o
homem.
Não gosto da
atitude destes cibernautas, que para defender os seus ideais, utilizam baixos
argumentos. São os hooligans da ideologia, hipócritas nos sentimentos: adquirem
a dor dos animais que comem ao almoço e muitas vezes fecham os olhos às imagens
que nos chegam da Síria ou da Nigéria.
Fico com pena
que a Liga Portuguesa Contra o Cancro, que é uma instituição que eu tanto
admiro, para a qual sempre contribuí, tenha criado esta situação e tenha
considerado imoral o contributo de muito boa gente.
Acima de tudo,
temos de ser pró-humanos, temos que lutar contra esta terrível doença que tanto
ataca a sociedade açoriana. Por isso, em nome dos terceirenses, eu peço
desculpa a todos os doentes oncológicos, que necessitam de auxílio, e que
ficaram sem ajudas.
Tenho a
ousadia de dizer que conheço pouca gente que gosta de animais como eu gosto,
mas sei que a diferença entre o homem e um animal irracional é enorme, mesmo
que a minha cadela Xixinha seja bem mais simpática do que muita gente que anda
por aí.
Há muitas
outras instituições que me fazem ter fé na humanidade. Como me disse a
Presidente da ACM-Terceira, Filomena Santos –
uma mulher que lida com situações mais difíceis que muitas touradas e
com as pessoas mais incríveis que eu conheço, e nos dá uma enorme esperança – “Eu sou amiga dos animais e, ainda mais amiga
das pessoas.”
http://no-teu-
coracao.blogspot.pt/
margaridabenedita@gmail.com
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