Chegou hoje a minha casa lavada
em lágrimas. Dizia que lhe doía a barriga. Pus-lhe a mão na testa e exclamei
alto: “Ui, está cheia de febre!”
Dei-lhe um comprimido e sentei-a
no sofá da sala com uma manta e uma botija de água quente. Pus a passar na
televisão um filme divertido de desenhos animados: “UP! Altamente!”. Sentei-me
ao seu lado. O choro compulsivo deu lugar a um soluço aqui e outro acolá.
Foi-se aninhando pouco a pouco, encostando a cabeça no meu braço, até que dei
por mim com uma lapa agarrada e a subir para o meu colo.
O choro desapareceu por completo
e deu lugar a muitas gargalhadas. À medida que o filme decorria, ela esquecia
as dores de barriga, tão confortável que estava nos braços da sua tia mais nova
que sorria, enternecida pelo carinho da sua sobrinha mais velha.
Tem já 9 anos, é a mais velha dos
irmãos e dos primos. Foi muito mimada quando nasceu. Era a novidade, a primeira
alegria depois da melancolia de ver a minha irmã sair de casa. A casa sempre
cheia foi esvaziando, muitos irmãos a casar e muitos sobrinhos a nascer... e,
inevitavelmente, as atenções da avó e dos tios (ainda que em número acrescido)
a terem de dividir-se por outros seres mais pequeninos que ela.
Passou a ser a mais velha e foi
crescendo, crescendo, crescendo. Tem só 9 anos mas já é crescida o suficiente para
ser independente. Não precisa de ajuda para comer nem para tomar banho. Escolhe
a sua própria roupa e acessórios e estuda sozinha. Tem um gosto pessoalíssimo e
uma personalidade muito vincada. Ajuda a tratar dos irmãos mais novos, fazendo
lembrar a mãe, quando, em pequena, cuidava da sua irmã ainda mais pequenina.
Muda a fralda ao bebé, dá-lhe de comer e consola-o quando chora: “A Mana está
aqui!”
Pois bem, hoje, com ou sem dores
de barriga, quem precisava de ser consolada era ela. De se sentir frágil como
um bebé e entregar-se nos braços da sua tia, recordando-lhe que também precisa
de mimos e que, apesar de ser já muito crescida, ainda é uma criancinha
pequenina.
Por essa mesma razão, hoje fui só
sua. Quanto à febre? Não
tenho a certeza se tinha. Mas, bem lá no fundo,
eu sabia que aquela exclamação convicta de que ela estava a arder a faria
sentir-se importante na sua dor, reconhecida.
E foi assim que aquela sobrinha
mais velha foi fechando os olhos, até que, antes de adormecer, disse umas
palavras que tocaram a alma da sua tia mais nova: “A tia é a melhor tia do
mundo!”
“E tu és o bebé querido e pequenino da tia!”
2 comentários:
♥♥♥♥!!! Até fiquei de olhos turvos! Estou a passar por esse processo de multiplicação e apesar de óptimo não é fácil para eles. .
São e serão sempre os nossos bebés!
LIKE!
Muito bom mesmo, conhecendo a sobrinha e a tia, imaginei tudo a acontecer.
beijinho para essa sobrinha mais velha.
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